28 junho 2007

Relatos de uma okupação... e um desalojo

"...um dia que ao invés de nos desanimar, nos provou a força da coletividade e dando mais força, revolta e experiência para seguirmos caminhando, sem dar passos atrás nesta luta sem final! Enaquanto houver gente sem casa e casas sem gente, haverá okupações! "


"Se morar é um privilégio, okupar é nesserário!"

à comunidade de Brazlândia,
à tod@s que meteram a mão na massa,
às/aos compas que nos desejaram sorte e prestaram apoio,

"Relatos de uma okupação... e um desalojo"

Era por volta de 7 hrs da manhã do dia 22 de dezembro de 2006, quando um grupo de 12 pessoas chegam ao local tão esperado. Uma casa pequena, com um quarto, um banheiro, uma salinha com cozinha e um pequeno espaço aberto em frente, passaria do abandono a okupação de vidas, sonhos e lutas. As 3 pessoas que pularam o portão, e com o auxílio de quem ainda estava de fora, destroem a fechadura, abrindo ao som do "kraak" as possibilidades para uma construção libertária. As tralhas e mochilas são logo colocadas a dentro, as pessoas observam o local sujo, e já começam a por as mãos na massa; dentro da casa vários sacos e caixas, fora se entulhavam centrimetros de terra, galhos, mato, mal podendo ser vista a "cor" do chão.

Antes

A porta da casa de fato, tampada com tijolos, é posta a baixo, enquanto pela janela de trás entravamos alguns ansios@s em ver dentro. Nos surpreendemos ao ver que a fiação elétrica ainda estava na casa, e tinha ainda vaso, torneiras, um armário novo e uma cama que poderia ser reaproveitada. Nos surpreendemos ainda mais quando mechendo no relógio de água ouvimos o som da descarga após ser puxada: tinhamos água! Logo começamos a desentulhar a entrada, levando os galhos pra fora e, com o empréstimo de um carrinho de mão e mais uma enchaida de vizinhos, levavamos terra, grama e tudo mais. Foi bom ver a reação também animada da vizinhança, pois curiosamente perguntavam-nos sobre o que estava aconteçendo, e nossas respostas muitas vezes curtas mas simpaticas de que acabaria aquela abandono e que revitalizariamos o espaço, sugeria o desejo de boa sorte, de força. E ao passo que retiravamos e sujeira, crescia mais e mais a felicidade, nossa e da comunidade, vendo pessoas integarindo num mutirão dando Vida ao abandono. Ao longo do dia, nos já em 16 pessoas que transitavam, surpreendiamos com nós mesm@s: atestamos que 'sem mutirão, não há solução!'. De 7 da manhã até umas 17 da tarde o local estava praticamente outro, sem nenhum entulho na frente nem dentro da casa, haviamos colocado uma porta no banheiro e o limpado, pintado de rubro-negro o portão, tampado os burracos do muro com retalhos de tijolo e cimento, ligado a água, limpavamos o chão empoeirado e ainda com ótimo diálogo com a comunidade; fizemos com esperança, camaradagem e criatividade o que alguém pago pra fazer não o faria; começavamos a rir ao ver se concretizando o começo de sonhos e projetos.

Depois

Foi então que, após a primeira chuva (que inclusive ajudou-nos a limpar mais a entrada), por volta de 17:30, ao invés da calmaria, chegam três políciais em um carro batendo no portão... Alegavam estar com a proprietária e, logo que abrimos, indagaram-nos -como de costume- o que faziamos alí, quem era o proprietário ou se alguém era parente. Adentraram a casa observando a situação enquanto tentavamos algum diálogo e argumentações, mostramos fotos de como estava o local antes, nosso projeto para o futuro Centro Social. Porém não tinha muito o que conversar com os políciais, a proprietária estava na delegacia, e já sabia do ocorrido desde as 11hrs. Foi presiço ir 2 pessoas lá falar com ela, enquanto outros 6 esperavam na casa sem saber o que aconteçeria. Na delegacia, a disposição da dona do abandono não era de diálogo, apenas queria seu imóvel de volta alegando que estava em construção, provavelmente para o deixar as traças novamente; ao menos não queria registrar ocorrência, o que nos complicaria com as acusações de invasão de domicílio e corrupção de menores. Na casa, ainda tinhamos esperança de nossa permanência e absurdamente contentes com nosso trabalho naquele primeiro dia, e que viria a ser o único. Então por volta das 19:30 chega à casa um delegado e um agente da polícia civil, mesmo que tentavamos esboçar alguma resistência e diálogo, não tinhamos muito o que fazer: ainda tinha raios de sol e pelo fato de ser o primeiro dia ali não preçissavam de mandato pra nos retirar. Estava feito mais um desalojo...

Nossas coisas ficaram na casa vizinha enquanto fomos todos levados a delegacia. Avisamos, já na primeira entrada da polícia, todas as pessoas que poderiam vir e nosso advogado, mas pela comunidade de Brazlândia ser uma das mais distântes do centro, puderam chegar só quando fomos liberados; novamente não tinha mais o que fazer além da triste lembrança dos bons momentos na casa. Mais uma vez a polícia nos mostra de que lado está...porém, não desistiremos assim tão fácil. A iniciativa de Anarcopunx envolvendo outras pessoas do meio autônomo, libertário e feminista, de "colorir o abandono" de uma casa sem função social à treze anos e sonhando/planejando isso à alguns meses, foi posta a baixo em um dia...um dia que ao invés de nos desanimar, nos provou a força da coletividade e dando mais força, revolta e experiência para seguirmos lutando, sem dar passos atrás nesta luta sem final! Enaquanto houver gente sem casa e casas sem gente, haverá okupações! Enquanto existir o Estado que protege o capital e as propriedades privadas, estaremos nós lá junto as comunidades exploradas pela sua emancipação, seu bem-estar e sua dignidade!

"Desalojos são destúrbios!"

levantar a cabeça e seguir na luta:
"podem desalogar nossos corpos e nossas coisas, mas nunca nossos sonhos"